Costuma-se
dizer (e não gosto muito desta ideia...) que o ano começa após o Carnaval. Que
seja assim, então, que o ano finalmente comece e possamos cuidar um pouco mais
daquilo que realmente importa.
O carnaval
trouxe para avenida a exuberância de corpos esculpidos em muitas horas de
exercícios intensos, dietas rigorosas, cirurgias estéticas e, quem sabe, algumas
doses de anabolizantes. Corpos perfeitos... diriam alguns.
Verão, tempo
de férias, praia e um olhar um pouco mais atento me sugere que a cada estação há
um contingente maior de pessoas obesas disputando um lugar ao sol...
Ao que me parece,
estamos lidando com dois extremos: o corpo exaustivamente cultuado e o corpo
negligenciado. Onde há excesso é comum encontrarmos problemas.
A OMS
considera a obesidade como um relevante problema de saúde pública. Nunca se
falou tanto em alimentação saudável; em treinamentos funcionais; em tratamentos
e intervenções cirúrgicas para o corpo perfeito. Exclui-se da alimentação sem o
menor critério glúten, lactose e até o arroz e feijão, que tem sido a base
alimentar dos brasileiros por anos e anos. Tudo com a proposta de reduzir o
peso e, quem sabe, aplacar a culpa por sentir fome. Come-se muito e arrepende-se muito, em um
movimento de significativa compulsão.
Assim, o
corpo, embora cultuado maciçamente na atual sociedade é também um corpo marcado
pela obesidade. A alimentação deixou de ser um processo natural de
sobrevivência e prazer para se tornar um fardo na vida contemporânea.
E isso parece
ser provocado pelo fato de estarmos buscando respostas para as angústias mais
primitivas na comida. Se há um vazio, provocado por uma ausência afetiva,
busca-se o preenchimento em um pedaço de torta. Se houve um aborrecimento no
trabalho, a saída é afogar as mágoas em petiscos na saída da empresa.
Utiliza-se como recurso, quase exclusivamente a geladeira.... Não se tem uma
disposição interna para lidar com os dissabores do cotidiano, percorre-se,
assim, o caminho supostamente mais fácil da compulsão à repetição. Em uma
infindável luta entre a balança e a dificuldade de lidar com aquilo que está
provocando o desassossego. Vai-se avolumando o corpo, como se buscasse uma
prótese psíquica para conter a inquietude da alma...
Em seu livro
A Cabala da Comida, Nilton Bonder fala sobre a ambivalência do querer ser magro
e do impulso que remete o indivíduo à geladeira para aplacar até mesmo a
necessidade de estar em contato como a própria essência. E diz:
“Uma criança nasce, cresce, chora. Está com fome, com
frio, solitária, não consegue entender o que está acontecendo. Está assustada e
confusa. Em cada uma destas situações a mãe pega a criança e a leva ao seio. E
então a criança se sente bem novamente.
E nós, o que fazemos? Sentimos fome? Vamos até o
refrigerador. Sentimos frio? Vamos até o refrigerador. Não entendemos o que
está acontecendo no mundo? Vamos até o refrigerador. Estamos deprimidos?
Queremos estar em contato com nossa essência? Vamos até o refrigerador.
No entanto, pode ser apropriado ao bebê ir ao encontro do
seio quando diante de todas estas necessidades, pois o seio, com certeza, dá
todas estas respostas e diz algo que tem a ver com estar solitário ou com frio,
solucionando os problemas. E se o sentimento é de estar confuso, há descanso no
seio...”
Assim, é preciso
que se tenha acesso a fonte certa para aplacar a angústia, na repetição
automática não haverá a saída, porque...
“E todo este meu tecido adiposo em excesso não é nada
mais do que um sinal de que não me dirigi à fonte correta. Estava procurando
algo que me ajudasse de imediato e recorri a apenas uma fonte quando deveria
ter recorrido a outras. ”
Por Mariangela Venas
Como sempre perfeito! Sempre falo que como quando estou feliz e como quando estou triste... E o que ganho além do peso, uma enorme culpa...
ResponderExcluirObrigada!!!
ResponderExcluirO problema está no excesso... Sempre! Aprender a lidar com os mecanismos que nos levam à compulsão é o caminho para a saúde...
Abraço
Parabéns! Excelente texto bastante atual onde se vive uma ditadura da magreza, ao mesmo tempo se vive o paradoxo da obesidade no mundo.
ResponderExcluirTantas pessoas em busca de cirurgia de redução de estômago, balão intragástrico, que após 2 a 3 anos da "mudança" voltam ao peso anterior, por que será? Será que uma das causas para se voltar a comer em excesso é que o emocional/psicológico não foi devidamente integrado? Obrigada pela partilha.
Muito obrigada!!!! :)
ExcluirHá, na atualidade, certa resistência para olhar para dentro... É o mundo do espetáculo!!!!
Abraço